quinta-feira, 3 de julho de 2014

Teatro/CRÍTICA

"Cássia Eller - O musical"

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Merecido e emocionado tributo



Lionel Fischer



Enquanto alguns políticos nefastos dão a sensação de que viverão para sempre, no tocante a astros da música brasileira ocorre o inverso. Partiram muito cedo, dentre outros, Elis Regina, Renato Russo e Cazuza, mais do que merecidamente homenageados com excelentes musicais. E o mesmo ocorreu com Cássia Eller, morta aos 39 anos, e que agora recebe oportuno tributo com "Cássia Eller - O Musical", em cartaz no Teatro I do CCBB.

De autoria de Patrícia Andrade, o espetáculo chega à cena com direção de João Fonseca e Viniciús Arneiro, estando o elenco formado por Eline Porto, Emerson Espíndola, Evelyn Castro, Jana Figarella, Mario Hermeto, Thainá Gallo e Tacy de Campos, esta última vivendo a protagonista. 

Exibindo uma estrutura narrativa cronológica, o texto nos mostra Cássia Eller desde o momento em que ainda não sabia exatamente o que fazer da vida até sua consagração como intérprete, incluindo suas relações de amizade e seus amores, em especial por Maria Eugênia, sua companheira com quem criou o filho Chicão. A peça também retrata, com extrema sensibilidade, alguns aspectos da personalidade de Cássia, como sua timidez e sua cada vez maior relação com as drogas.

Estamos, portanto, diante de um texto que faculta ao espectador um retrato pertinente não apenas da vida, mas também da trajetória artística de uma intérprete maravilhosa, dotada de voz poderosa e notável singularidade. E tais virtudes são bastante valorizadas pelo excelente espetáculo, que exibe um total de 34 canções, algumas delas referências na trajetória de Cássia Eller, como "Lanterna dos afogados", "Que país é esse", "Malandragem", "Socorro" e "Por enquanto", dentre outras. 

Impondo à cena uma dinâmica simples e despojada, abdicando por completo de qualquer resquício de suntuosidade, João Falcão e Viniciús Arneiro priorizaram um caráter intimista, possibilitando à plateia uma aproximação com Cássia Eller como se ela - ao menos em alguma medida - tivesse efetivamente feito parte de nossas vidas, de nosso cotidiano. Renunciando ao endeusamento e à mitificação, os encenadores optaram sabiamente por humanizar a grande e inesquecível cantora.

No tocante ao elenco, Tacy de Campos (preparada pela excelente atriz e bailarina Ana Paula Bouzas) encarna Cássia Eller de forma exemplar, não apenas no que diz respeito ao canto, mas também às passagens faladas, valorizando ao máximo as principais características da personalidade retratada, cabendo também destacar sua ótima performance corporal. Sem dúvida, uma atriz/cantora cuja trajetória merece ser acompanhada com extrema atenção.

Quanto aos demais intérpretes, todos se saem muito bem nas partes cantadas e nos muitos personagens que interpretam, e certamente à força do conjunto deve ser creditada uma parcela significativa do sucesso da presente empreitada. Mas tal sucesso se deve ainda às preciosas contribuições de vários profissionais. Vamos começar pela direção musical e performance dos músicos.

Lan Lan criou arranjos maravilhosos, plenos de originalidade e impregnados de grande emoção. E, suprema dádiva, conseguiu o prodígio de fazer com que o acompanhamento não abafasse as vozes, o que muitas vezes tem ocorrido em nossos musicais - neste particular, um agradecimento todo especial ao ótimo baterista Maurício Braga, que não se relaciona com seu instrumento como se por ele nutrisse incontrolável raiva. Cabe também destacar o virtuosismo de Felipe Caneca (piano), Pedro Coelho (baixo), Diogo Viola (guitarra) e Fernando Caneca (violão), este último valendo-se de harmonias deslumbrantes.

Na ficha técnica, Marília Carneiro e Lydia Quintais assinam figurinos em total consonância com a classe social e personalidade dos personagens, sendo igualmente irrepreensíveis a belíssima cenografia de Nello Marrese e Natália Lana, e a igualmente bela iluminação de Maneco Quinderé, que sublinha com grande sensibilidade todos os climas emocionais em jogo. A destacar também o visagismo de Beto Carramanhos, a preparação vocal de Marco Dantonio e a preciosa contribuição do engenheiro de som Carlos Esteves, ao que suponho também responsável por escutarmos claramente os cantores e aqueles que os acompanham.

CÁSSIA ELLER - O MUSICAL - Texto de Patrícia Andrade. Direção de João Fonseca e Viniciús Arneiro. Com Tacy de Campos, Eline Porto, Emerson Espíndola, Evelyn Castro, Jana Figarella, Mario Hermeto e Thainá Gallo. Teatro I do CCBB. Quarta a domingo, 19h.






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