quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Teatro/CRÍTICA

"Irmãos de sangue"

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Montagem deslumbrante no CCBB



Lionel Fischer



"O universo de Irmãos de Sangue é construído em torno da memória, a partir de objetos que solicitam essa memória, como experiência comum. Todas as memórias e lembranças dessa família fazem emergir os conflitos enterrados. A história é feita de idas e vindas, de alternâncias entre o passado e o presente. A música original vem alimentar e se fundir na dramaturgia gestual, sublinhando o não-dito e o amor fraternal incondicional".

O trecho acima, de autoria de André Curti e que consta do ótimo release que me foi enviado pela assessora de imprensa Mônica Riani, sintetiza as premissas essenciais do mais recente trabalho da Cia. Dos à Deux, "Irmãos de sangue", em cartaz no Teatro I do CCBB. André Curti e Artur Ribeiro respondem pela dramaturgia, cenografia, coreografia e direção, estando o elenco formado por Cécile Givernet, Matías Chebel, André Curti e Artur Ribeiro.  

Como explicitado no parágrafo inicial, estamos diante de um espetáculo estruturado em torno da memória, sendo esta disparada pelo contato com objetos. Estes, portanto, tornam-se determinantes para o aflorar de múltiplas e diversificadas emoções, transcendendo sua condição meramente utilitária e convertendo-se, ao menos em alguma medida, em protagonistas da narrativa.

Esta começa com uma belíssima cena em que dois irmãos lavam o corpo do pai falecido, o vestem e o enterram. Em seguida, numa passagem igualmente bela e de exasperante angústia, se despedem. A partir daí, acompanhamos o retorno de ambos à infância, a chegada de um novo irmão e as disputas pelo afeto da mãe, com algumas passagens exibindo desconcertante e irresistível humor. Finalmente, perto do final, os irmãos adultos repetem a cena inicial, quem sabe sugerindo que tudo que foi visto ocorreu em suas memórias enquanto davam o abraço inicial de despedida.

Para quem acompanha a trajetória da Cia Dos à Deux, fundada em 1998, o presente espetáculo só faz ratificar a excelência do conjunto. Ao optarem por renunciar à palavra oral, André Curti e Artur Ribeiro foram cada vez mais aprimorando um riquíssimo universo gestual, da mesma forma que vem conseguindo valorizar todas as possibilidades expressivas do silêncio. Afora isso, cumpre destacar a criatividade da dinâmica cênica e a maestria com que trabalham os tempos rítmicos. E se somarmos a isto um apuradíssimo preparo corporal dos intérpretes e a inteligência cênica que todos evidenciam, o resultado só poderia ser um espetáculo memorável, inesquecível e que sem dúvida se inserirá entre os melhores da atual temporada.

Na equipe técnica, Fernando Mota responde por uma música original da mais alta expressividade, tanto em suas passagens mais dramáticas quanto naquelas em que o humor predomina. A mesma excelência se faz presente na cenografia e coreografia de André Curti e Artur Ribeiro, nos figurinos e marionetes de Natasha Belova, nos acessórios, perucas e objetos de Maria Adélia e Marta Rossi (com assistência de Morgam Olivier e Camila Moraes) e na fantástica iluminação de Bertrand Perez e Artur Ribeiro, cabendo destacar a força obtida com os contrastes de luz e sombra.

IRMÃOS DE SANGUE - Dramaturgia e direção de André Curti e Artur Ribeiro. Com Célile Givernet, Matías Chebel, André Curti e Artur Ribeiro. Cia Dos à Deux. Teatro I do CCBB. Quarta a domingo, 19h.

  


2 comentários:

  1. Tive um problema neste espetáculo em Janeiro no CCBB do Rio de Janeiro. Estando sentado em uma das cadeiras, fui constantemente incomodado por outra pessoa na cadeira de trás. Olhei algumas vezes com a esperança de que a pessoa parasse. Este continuou me incomodando, me virei e disse para parar de chutar minha cadeira. Ele deu um chute e disse: agora estou chutando. Respondi: olha vou chamar a segurança, e ele disse: pode chamar. Falei com uma das pessoas da produção o que ocorreu e me disseram que nada podiam fazer pois era um "teatro gestual", o mesmo me disse o segurança. Me ofereceram um ingresso para outro dia mas preferi o reembolso. Se não se importam com o espectador, realmente não vale ver o espetáculo. Uma pena. Meu comentário já foi apagado diversas vezes da companhia francesa em sua página do facebook. Espero que aqui possa ao menos expor minha crítica

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  2. Augusto amigo,

    realmente lamentável a atitude deste espectador, certamente indigno de estar na plateia assistindo a um espetáculo memorável. Mas você fez o que tinha que fazer, sendo uma pessoa civilizada. Realmente uma pena que não tenha sido tomada a única providência cabível: a retirada desse débil mental que chutava a sua cadeira.

    Te agradeço ter postado aqui sua queixa, com a qual me solidarizo inteiramente.

    Abraços,

    Lionel Fischer:

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