terça-feira, 12 de novembro de 2013

Teatro/CRÍTICA

"Conselho de classe"

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Pertinente e hilariante reflexão sobre o ensino


Lionel Fischer



"Em cena, uma reunião de professores é desestabilizada pela chegada de um novo diretor. Esse encontro faz eclodir dilemas éticos e pessoais em meio a decisões que se confundem nas relações de poder da instituição escolar. O texto faz uma abordagem realista do ambiente escolar, a fim de gerar um diálogo a respeito da educação no Brasil e da atual situação no mundo. Hoje, quem deseja trabalhar em uma escola pública? No hospital público? Se o professor é mal remunerado e trabalha sob condições difíceis, que tipo de sociedade está sendo construída?"

O trecho acima, extraído do release que me foi enviado, resume o enredo e as principais questões levantadas pelo autor Jô Bilac em "Conselho de classe", em cartaz na Sede das Cias, na Lapa. Mais recente produção da Cia. dos Atores, a montagem (que já cumpriu ótima temporada no Espaço Sesc) chega à cena com direção de Bel Garcia e Susana Ribeiro, estando o elenco formado por Cesar Augusto, Leonardo Netto, Marcelo Olinto, Paulo Verlings e Thierry Trémouroux.

Certamente um dos melhores autores da nova geração de dramaturgos cariocas, acredito que este seja o mais expressivo texto de Jô Bilac. Afora a pertinência dos temas que aborda, o autor consegue mesclá-los a questões pessoais dos personagens, criando um contexto em que eventuais teorizações sobre o ensino decorrem de acontecimentos reais da instituição e de pontos de vista divergentes dos professores sobre os mesmos. E aqui cabe registrar a habilidade de Jô Bilac ao criar diálogos que exibem sólidos argumentos de todos os envolvidos, dando a entender que todos podem ter sua parcela de razão, mas que a lugar algum se chegará se não houver um consenso.

Exibindo maravilhosos personagens, diálogos magistralmente construídos, sólidas reflexões e irresistível humor, "Conselho de classe" recebeu esplêndida versão cênica de Bel Garcia e Susana Ribeiro. Não sei se a ideia dos professores serem na realidade professoras partiu de Jô ou das diretoras. Seja como for, o fato é que tal opção causa um delicioso estranhamento inicial, mas logo passamos a acreditar piamente que estamos diante de um corpo docente feminino. E tal crença se deve ao fato de que os atores jamais lançam mão de trejeitos visando uma comicidade fácil. Pelo contrário: são mulheres vestidas como homens e ponto final - se alguém se sentir incomodado, que faça análise.

Mas voltando ao espetáculo. Ainda que procurasse encontrar ao menos uma ressalva - o que não faz o meu estilo - não a encontraria. As marcas são sempre diversificadas e imprevistas, é total o domínio dos tempos rítmicos e tanto as tensões quanto as passagens em que o humor predomina são trabalhadas de forma irrepreensível - no tocante ao humor, o momento em que mosquitos invadem a quadra de esportes onde se realiza a reunião é dos mais hilariantes que já testemunhei nesses 24 anos de crítica teatral. Afora isso, as diretoras exibem o mérito suplementar de haver extraído atuações deslumbrantes de todos os atores.

Na pele de Célia Patrícia, veterana e algo desiludida professora de Biologia e Matemática que vende variados produtos às escondidas dentro da escola, Cesar Augusto exibe uma das melhores performances de sua carreira. O mesmo se aplica a Leonardo Netto, irresistível encarnando a apoplética Edilamar, professora de Educação Física. Vivendo Tia Paloma, responsável pelo ensino de Português e Literatura Brasileira, Marcelo Olinto consegue materializar a irônica sabedoria da velhíssima senhora, exibindo notável trabalho corporal. A Mabel (professora de Artes) criada por Thierry Trémouroux nos remete a ideais que parecem um tanto esquecidos e suas explosões em tudo se assemelham ao furor das grandes tempestades. Finalmente, Paulo Verlings: ainda que bem mais jovem que seus colegas de cena, nem por isso o ator deixa de exibir seu grande talento, construindo um diretor que, inicialmente buscando o entendimento e a conciliação, logo também se deixa levar pela histeria generalizada.

Com relação à equipe técnica, considero absolutamente irretocáveis os trabalhos de todos os profissionais envolvidos nesta imperdível empreitada teatral - Rô Nascimento e Ticiana Passos (figurinos), Aurora de Campos (cenografia), Maneco Quinderé (iluminação) e Felipe Storino (trilha original).

CONSELHO DE CLASSE - Texto de Jô Bilac. Direção de Bel Garcia e Susana Ribeiro. Com Cesar Augusto, Leonardo Netto, Marcelo Olinto, Paulo Verlings e Thierry Trémouroux. Sede das Cias. Sábado, domingo e segundo às 20h.

  


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