sexta-feira, 12 de julho de 2013

Teatro/CRÍTICA

"A falecida"


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Bela montagem com atuações questionáveis



Lionel Fischer



"A peça conta a história de uma mulher frustrada do subúrbio carioca, a tuberculosa Zulmira. Pobre e doente, sua única ambição é um enterro luxuoso para vingar-se de Glorinha, sua prima e vizinha que não a cumprimenta mais. O marido, Tuninho, está desempregado e torra as sobras de sua indenização na sinuca e nos estádios de futebol. No leito de morte, Zulmira manda o marido procurar o poderoso milionário Pimentel, para que este lhe pague um enterro suntuoso. Mas Tuninho acaba descobrindo que Zulmira fora amante de Pimentel..."  

Extraído (e levemente editado) do ótimo release que me foi enviado pela assessoria de imprensa JS Pontes Comunicação, o trecho acima resume o enredo da peça - só me permiti não explicitar seu desfecho, pois isso privaria o leitor/espectador de uma reviravolta simplesmente fantástica, que só um autor como Nelson Rodrigues poderia criar.

Em cartaz no Teatro Maison de France, "A falecida" chega à cena com direção de Moacyr Góes e elenco formado por Bianca Rinaldi (Zulmira), Leon Góes (Tuninho), Simone Centurione (Madame Crisálida/ Mãe / cantora), Sérgio Kauffmann (Parceiro 2/ Funcionário 1), Ricardo Damasceno (Oromar/ Pimentel), Daniel Carneiro (Parceiro 1/ Funcionário 2/ Pai) e Augusto Garcia (Timbira).

Considerada pelos especialistas como a primeira tragédia carioca, "A falecida" já mereceu incontáveis ensaios, certamente feitos por pessoas bem mais competentes do que eu. Ainda assim, ouso afirmar que o autor trabalha magistralmente temas como frustração, abandono, inveja, desejo de transcender uma vida miserável através de um desfecho deslumbrante etc. E tudo isto, naturalmente, valendo-se de ótimos personagens e diálogos brilhantes, fatores sempre presentes na obra de Nelson.

Com relação ao espetáculo, Moacyr Góes impõe à cena uma dinâmica em total sintonia tanto com relação aos conteúdos trágicos como no que concerne àqueles em que o humor predomina. Cabe também registrar a força e originalidade das marcações, assim como a inventividade de todas as transições. No entanto, uma ressalva se faz imperiosa: sua atuação junto ao elenco - e aqui me refiro basicamente à performance de Bianca Rinaldi, que acaba por influenciar parte da de Leon Góes.

Não tenho como saber se partiu da atriz ou do diretor a ideia de criar uma Zulmira completamente destituída de vigor, que só muito raramente altera o andamento de suas falas ou seu tom de voz. Bianca Rinaldi tem o físico adequado para o papel, diz suas falas de forma inteligível e com as intenções certas. Mas o resultado final é apático, desapaixonado, quando o inverso se faria necessário. E essa leitura da personagem, como já foi dito, acaba contagiando a performance de Leon Góes, ao menos quando Tuninho dialoga com a esposa, ambos assumindo um tom que seria bem mais adequado à televisão - em outras passagens, no entanto, Leon se solta bem mais, exibe humor e dramaticidade, além de impecável trabalho corporal.

Não sei se Moacyr Góes e Bianca Rinaldi estão abertos a sugestões. Caso estejam, sugiro que experimentem, nem que seja em um ensaio, imprimir maior paixão e virulência à personagem Zulmira, assim como um certo "enlouquecimento" que ela progressivamente evidencia. Isso determinaria um outro ritmo, uma outra pulsação, o que possibilitaria a Bianca Rinaldi fazer uma Zulmira muito mais interessante e visceral. A atriz possui talento suficiente para isto. Fica a sugestão.  

Com relação aos demais atores, Sérgio Kauffmann, Ricardo Damasceno e Daniel Carneiro exibem atuações corretas, com Simone Centurione valorizando ao máximo sua personagens. Quanto a Augusto Garcia, o ator está excelente na pele de Timbira, dono da funerária e mulherengo incorrigível.

Na equipe técnica, Teca Fichinski assina uma cenografia deslumbrante, sugerindo uma atmosfera de abandono e decadência, sendo irrepreensíveis os figurinos, também de sua autoria. A mesma excelência se faz presente na iluminação de Paulo César Medeiros e na direção musical e trilha sonora original de Ary Sperling.

A FALECIDA - Texto de Nelson Rodrigues. Direção de Moacyr Góes. Com Bianca Rinaldi, Leon Góes, Simone Centurione, Sérgio Kauffmann, Ricardo Damasceno, Daniel Carneiro e Augusto Garcia. Teatro Maison de France. Quinta, sexta e domingo, 20h. Sábado, 21h. 





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