terça-feira, 26 de julho de 2011

Estrutura Dramatúrgica
do Teatro de Revista

1. Quadros obrigatórios e alegóricos:

da IMPRENSA - onde se apresentavas os jornais da época.
do TEATRO - traçava um panorama cômico das atividades teatrais do ano.
das DOENÇAS - a varíola e a febre amarela apareciam devidamente personificadas.
O ANO VELHO e o ANO NOVO - também eram personificados.

2. Compére ou Compadre - apresentava os quadros, comentava, pactuava com a platéia. Conduzia a ação, ligando o espetáculo de ponta a ponta. Era mais uma convenção do que um personagem. Dupla de compadres - como o tony (mais bobo) e o clown (vivo, esperto) circenses. Podia haver também a Comère.

Aglutinador, apresentador, comentarista, dançarino, cantor, bufão, contador de piadas, ele atravessa a revista de ponta a ponta para costurar os diversos quadros, cristalizando a dinâmica do pacto com a platéia, característica própria do teatro popular. Este papel era geralmente reservado ao primeiro cômico da companhia.

3. Personagens-tipo - estavam sempre relacionados diretamente com a cidade do Rio de Janeiro. Tipos sempre presentes:

O Malandro - encarnava o perfil do carioca - às vezes malandro, às vezes cômico. As comédias gregas já apresentavam personagens trapaceiros, vadios e mulherengos. Podia ter vários nomes. Mas sempre sabia se virar: trambiqueiro, clandestino, marginal. E tal como nas ruas do Rio de Janeiro, pelas revistas de ano de Artur Azevedo desfilam caloteiros, trapaceiros, assaltantes, todos trajados com o melhor figurino da tipificação nacional: a bilontragem. Atores: Oscarito, Grande Otelo e Zé Trindade, dentre outros.

Ao desrespeitar as duas maiores instituições do capitalismo, o trabalho e a família (pois o trambiqueiro estava pronto a cortejar qualquer mulher bonita, mesmo se ela fosse casada), o malandro deixava entrever a alegria de ser marginal. Ele desencadeava o jogo com o mito popular de que "nesta terra se virando tudo dá". E no sistema moral das revistas, as malandragens, os trambiques, as marmeladas e os pequenos golpes nunca eram punidos. No final, tudo era resolvido com o jetinho brasileiro.

A Mulata - tipo mais sedutor do teatro brasileiro. Na disputa do seu coração o português e o malandro se enfrentam. A mulata aparece inicialmente como baiana. As primeiras mulatas eram atrizes brancas. Linguajar da mulata - vindo da senzala, chega à cidade e incorpora as gírias, os neologismos à sua maneira peculiar de falar e ficou pernóstica. A mulata mais famosa foi Araci Cortes.

O Caipira - ingênuos sertanejos encantados com o progresso da Capital Federal. Podia ser um pobre coitado ou um rico fazendeiro do café. Os papéis a ele destinados eram diversos, transformando-o numa espécie de "valor nacional" em oposição aos moldes estrangeiros. Foi Martins Pena quem introduziu o caipira no teatro brasileiro, em 1883 (Um sertanejo na corte). Artur Azevedo escreveu o personagem Euzébio de O Tribofe para Brandão, o Popularíssimo. O personagem do caipira imortalizou-se com o ator Mazzaroppi. A atriz mais famosa foi Alda Garrido.

O Português - grossos bigodes, tamancos, sotaque, burro, vítima do escracho e do bom humor do brasileiro, o português da piada.

A Mulher Fatal - a cocotte. Fingia amor para tirar dinheiro do português ou do caipira. Muitas vezes era um falsa estrangeira.

A Caricatura Viva - retratava pessoas conhecidas da política, das artes ou da sociedade. Na encenação procurava-se copiar a figura. A platéia reconhecia com facilidade o ridicularizado, que geralmente tem um outro nome. Em O Carioca - revista de Artur Azevedo de 1886 - o Doutor Sá Bichão, caricatura viva do professor Castro Lopes, cria vários termos para substituir as palavras francesas em uso corrente pelos brasileiros. Foi Castro Lopes quem introduziu:

cinesíforo - no lugar de chauffeur
convescote - no lugar de piquenique
cardápio - no lugar de menu

Na peça o personagem Sá Bichão se assemelha a um personagem da comédia dell'arte, utilizando-se do latim e de extensas explicações complicadas - um prato cheio para os revistógrafos.

O presidente Getúlio Vargas se divertia com as caricaturas de sua pessoa no palco, porém, sem ridicularizações.

4. Metalinguagem - a prática de revelar as técnicas dramatúrgicas e da encenação sempre seduziu as platéias. A metalinguagem sempre foi um recurso utilizado pelo teatro popular. Na revista esse procedimento era comum.

5. Coplas - em francês couplets eram composições em versos destinadas a serem cantadas. No entanto, faziam parte integrante do texto dramático. Apresentava os personagens. O personagem se apresentava cantando - ária de apresentação.

6. A revista traz uma mudança espacial para os autores brasileiros. Até então, assistíamos ao teatro de gabinete, aos espaços domésticos íntimos, privados. Com a revista sobe à cena o espaço público e aberto. A revista supera o realismo convencional do drama realista e da peça de tese, levando-o aos seus limites:

Lá está a Capital, com sua ruas, prédios, monumentos, personagens típicos e mazelas características. (...) Lá está a linguagem popular, com seus acentos e gírias habilidosamente teatralizados. Lá está a História miniaturizada num painel anual onde se misturam guerras, personagens ilustres, eleições, Abolicionismo, República e reclamações do dia-a-dia contra a companhia telefônica, o preço do transporte ou os serviços de limpeza urbana. Lá está a Opinião Pública, eminência parda cujo poderio se fortalece nesta passagem do século XIX para o XX. (Flora Süssekind)
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Extraído de "História e Dramaturgia do Teatro Brasileiro I", professora Elza de Andrade, CAL, 2001. Bibliografia:

SÜSSEKIND, Flora. "As revistas do ano e a invenção do Rio de Janeiro". Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986. 

VENEZIANO, Neyde. "O teatro de revista no Brasil". Campinas: Pontes, 1991.

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