segunda-feira, 13 de junho de 2011

Teatro/CRÍTICA

"O filho eterno"

..................................................
Comovente e dupla jornada


Lionel Fischer


A Cia. Atores de Laura está completando 19 anos de existência e, pela primeira vez em sua brilhante trajetória, está apresentando um monólogo. Baseado no livro homônimo de Cristovão Tezza, ganhador de inúmeros e importantes prêmios literários, "O filho eterno" chega à cena (Oi Futuro Flamengo) com direção de Daniel Herz, adaptação de Bruno Lara Resende e interpretação de Charles Fricks.

O tema central do belíssimo livro de Tezza é a relação que um pai é forçado a estabelecer com seu primeiro filho, portador da Síndrome de Down. Aguardado com eufórica expectativa, esta logo é substituída por aterradora decepção, afora um sentimento de vergonha em função da irremediável deficiência do filho.

Aos poucos, porém, e muito lentamente, a postura do pai vai se modificando e o horror inicial cede espaço a uma progressiva tentativa de estabelecer um real contato com alguém que, em princípio, não estaria capacitado a escapar de seu limitado universo, o que revela-se absolutamente falso. Mesmo que o filho jamais possa ser considerado um ser humano "normal", isso não o impede de dar e receber afeto.

Estamos, portanto, diante de uma obra que, se por um lado mostra a dilacerante jornada de um pai em busca de compreender e aceitar seu filho, por outro também trabalha, de forma magistral, a jornada deste mesmo homem em busca de entender-se, de avaliar sua relação consigo mesmo, com sua profissão e com o mundo que o cerca. São, portanto, duas jornadas, igualmente tocantes, plenas de contradições e fartas doses de humanidade.

Com relação à adaptação, Bruno Lara Resende realizou um trabalho admirável, conseguindo sintetizar os principais conteúdos propostos pelo autor. E a mesma eficiência se faz presente na direção de Daniel Herz,  que impõe à cena uma dinâmica que traduz, de forma sensível e contundente, as muitas e dolorosas etapas por que passa o protagonista. 

Este é interpretado, de forma absolutamente irrepreensível, por Charles Fricks, sem dúvida um dos melhores atores de sua geração. Possuidor de vastos recursos expressivos, tanto vocais como corporais, o que mais me impressiona neste intérprete é a inteligência de suas escolhas, afora sua corajosa capacidade de entregar-se por completo aos personagens que encarna. E aqui tais predicados fazem-se presentes de forma superlativa, o que só me faz desejar que os sempre caprichosos deuses do teatro continuem a abençoar a trajetória deste ator de exceção.

Na equipe técnica, Marcelo Pies responde por um um figurino correto, com a despojada cenografia de Aurora dos Campos conseguindo reforçar, a partir de uma cena quase sempre vazia - tudo se resume a duas cadeiras - a exasperante solidão do protagonista. Cumpre também destacar a ótima direção musical de Lucas Marcier, a precisa direção de movimento de Márcia Rubin e, em especial, a iluminação de Aurélio de Simoni, que estabelece sensível sintonia com os estados de espírito do personagem.

O FILHO ETERNO - Texto de Cristovão Tezza. Adaptação de Bruno Lara Resende. Direção de Daniel Herz. Com a Cia. Atores de Laura. Interpretação de Charles Fricks. Oi Futuro Flamengo. Sexta a domingo, 19h30.

Nenhum comentário:

Postar um comentário