sábado, 18 de setembro de 2010

Teatro/CRÍTICA

"Doidas e santas"

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Pertinentes reflexões sobre o amor


Lionel Fischer


Livremente inspirada no livro homônimo de contos de Martha Medeiros, a peça em questão tem como principal foco a relação amorosa de um casal, Beatriz e Orlando, juntos há 20 anos. Beatriz é uma psicanalista de sucesso, uma mulher moderna, antenada, financeiramente independente. Mas não é feliz em seu casamento com Orlando, um homem parecido com a maioria, ou seja, muito chegado a futebol, cerveja e sobretudo desatento àquelas pequenas delicadezas cotidianas que, aparentemente irrelevantes, são fundamentais para o fortalecimento de uma relação, e mais ainda quando a mulher tem uma natureza romântica - aliás, quase todas têm uma natureza romântica, mesmo as que adotam uma postura fálica.

Então, um belo dia, Beatriz resolve se separar, e suas alegações não encontram respostas satisfatórias por parte do marido. A filha do casal, Marina, uma adolescente de 15 anos, não participa desse momento específico, que a protagonista partilha um pouco com sua irmã, a solteirona Berenice. No complemento da família, temos D. Elda, uma senhora tresloucada que só surge no final e vive às turras com a neta.

Eis, em resumo, o enredo de "Doidas e santas", em cartaz na Sala Tônia Carrero do Teatro do Leblon. Com dramaturgia assinada por Regiana Antonini, a peça chega à cena com direção de Ernesto Piccolo e elenco formado por Cissa Guimarães (Beatriz), Giuseppe Oristanio (Orlando) e Josie Antello, que dá vida às demais personagens.

Como foi criado a partir de crônicas independentes entre si, ainda que tendo como principal foco o amor, como já foi dito, em alguns momento temos a sensação de que o texto perde um pouco seu caráter dramatúrgico (em termos de ação dramática) e enverada para o lado confessional, mesmo nas passagens em que Beatriz fala com o marido - quando se dirige diretamente à platéia, aí torna-se evidente que busca nela uma possibilidade de escuta, da qual carecia com seu parceiro. Mas como as reflexões empreendidas por Martha Medeiros são da maior pertinência, os espectadores se mantêm atentos e interessados, o que aconteceria mesmo que Cissa Guimarães estivesse sozinha em cena.

Quanto ao espetáculo, Ernesto Piccolo impõe à cena uma dinâmica, digamos, comportada e funcional, pois não haveria mesmo outra postura a ser adotada. Mas, ainda assim, em alguns momentos consegue criar passagens divertidas, que servem de contraponto àquelas em que a dor predomina. E cabe também destacar a habilidade do encenador de extrair atuações convincentes de Giuseppe Oristanio (excelente ator, com ótimos trabalhos realizados tanto no teatro como na TV) e da excelente comediante que é Josie Antello.

No que se refere a Cissa Guimarães, a atriz vive com notável capacidade de entrega as emoções inerentes a toda separação, comovendo profundamente a platéia ao extravasar as dores de Beatriz, suas mágoas, desapontamentos, carências, assim como a nostalgia dos momentos felizes de um passado que parece impossível de ser resgatado. Ao mesmo tempo, não deixa de exibir seu mais do que conhecido humor quando este se faz necessário. Enfim, uma atuação segura, convincente, emocionada e emocionante, o que nos faz desejar que Deus continue a abençoar e proteger essa profissional que, segundo todos que a conhecem, a todos ilumina com sua coragem e inabalável fé na vida.

Na equipe técnica, são corretos os trabalhos de todos os profissionais envolvidos neste projeto - Sérgio Marimba (cenografia), Jorginho de Carvalho (iluminação), Rodrigo Penna (trilha sonora) e Helena Araújo e Djalma Brilhante (figurinos).

DOIDAS E SANTAS - Texto de Regiana Antonini. Direção de Ernesto Piccolo. Com Cissa Guimarães, Giuseppe Oristanio e Josie Antello. Teatro do Leblon. Quinta e sexta, 21h30; sábado, 19h30 e 21h30; domingo, 20h.

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