quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

Teatro/ Profissionais que mais se destacaram em 2008



AUTOR


Daniela Pereira de Carvalho

Tendo como enredo a complexa releção entre um casal de irmãos e um policial, que durante toda a peça têm a cocaína como parceira inseparável, "Por uma vida um pouco menos ordinária" exibe um retrato amargo da sociedade em que vivemos. E tal amargura está atrelada a uma espécie de renúncia a qualquer resistência, como se nada mais pudesse ser feito para reverter o deprimente quadro atual, mesmo quando os personagens refletem sobre suas vidas e eventualmente concluem que se perderam. Ainda que por vezes o texto enverede mais para o campo da reflexão do que da ação, embora esta não deixe de existir, estamos diante de uma peça que propõe reflexões inadiáveis, expressas através de personagens bem construídos e diálogos que reiteram as grandes qualidades da jovem autora.


Carla Faour

Primeiro texto escrito pela atriz, "A arte de escutar" tem como tema central algo de que todos carecemos: alguém que nos escute, sem qualquer preocupação de emitir opiniões a respeito do que ouviu. Uma escuta silenciosa, espécie de abrigo para inadiáveis desabafos. Estruturada como uma série de "depoimentos", a peça expõe uma vasta gama de carências, mágoas, desencontros e projetos não consumados, sempre mesclando humor e dramaticidade. Sem dúvida, uma estréia promissora.


Jô Bilac

Tendo como tema central um triângulo amoroso, "Cachorro" é um texto de exclente qualidade, exibindo ótimos diálogos e personagens muito bem construídos. E cabe ressaltar a capacidade do autor de prestar um tributo a Nelson Rodrigues sem tentar, em nenhum momento, copiar seu estilo. O autor consegue imprimir sua marca, mesclando com grande habilidade momentos trágicos e hilariantes. Jô Bilac é uma gratíssima revelação.


Bosco Brasil

Impondo um caráter metafórico às oscilações do tempo, em especial da chuva e das nuvens, o autor conseguiu, em "Cheiro de chuva", abordar sentimentos essenciais através de uma estrutura narrativa que foge completamente ao convencional - só raramente os dois personagens conversam de forma direta, em especial quando falam de si mesmos. Nesses momentos, é como se monologassem, como se apenas pensassem em voz alta, como se fosse impossível abrir inteiramente o coração um para o outro. Trata-se de uma peça que exibe uma versão sutil e delicada do amor.


João Falcão

Tendo como mola propulsora o personagem de um jovem autor que tenta escrever um texto, João Falcão consegue, em "Clandestinos", criar uma comédia deliciosa, que ironiza o mercado de trabalho de forma implacável e crítica, chegando a um resultado ao mesmo tempo muito engraçado e repleto de humanidade.

_____________________



DIRETOR

Ana Teixeira

Tendo por base artigos, depoimentos e fatos reais envolvendo a grave questão entre judeus e palestinos, a diretora Ana Teixeira conseguiu, em "O dragão", materilizar um dos mais belos e comoventes espetáculos do grupo Amok Teatro, impondo à cena uma dinâmica seca, austera e altamente expressiva.

Guilherme Leme

Tendo à disposição o ótimo texto "A forma das coisas", de Neil Labute, Guilherme Leme o converteu em uma das montagens mais significativas da temporada, graças a uma dinâmica cênica ágil, criativa e sofisticada, precisa no tocante ao ritmo e capaz de valorizar todos os conteúdos propostos pelo autor.

Ary Coslov

Um dos melhores textos de Harold Pinter, recentemente falecido, "Traição" chegou à cena em marailhosa versão assinada por Ary Coslov, que teve a sagacidade de dispensar inúteis mirabolâncias formais e se concentrar no que realmente importava: a relação entre os personagens, a diversidade de climas e os angustiantes silêncios.

Hugo Rodas

Baseado em cartas, relatos e no diário da imperatriz Maria Leopoldina Josefa Carolina de Habsburgo, o espetáculo "Leopoldina - Cartas e relatos" resultou em um dos mais belos da temporada. Ainda que lançando mão de poucos recursos cênicos, o diretor Hugo Rodas chegou a um resultado belíssimo.

João Falcão

Inspirado nas histórias de jovens artistas que vieram para o Rio de Janeiro em busca da grande chance, João Falcão conseguiu criar, em "Os clandestinos", uma dinâmica cênica altamente expressiva e diversificada, irretocável no tocante ao ritmo e que valorizou ao extremo tantos as passagens mais dramáticas quanto aqueleas em que o humor predominava.

____________________

ATOR

Sergio Britto

No espetáculo "Ato sem palavras 1" / "A última gravação de Krapp", o ator Sergio Britto - 85 de idade, 63 de carreira - conseguiu materializar todos os conteúdos propostos por Beckett, exibindo notável capacidade de entrega e sua habitual inteligência cênica. Sob todos os aspectos, uma performance memorável.

Marcelo Escorel

Um dos melhores atores de sua geração, Marcelo Escorel exibiu ótima performance em "Cheiro de chuva", cuja grande dificuldade residia em dar vida a um personagem que nada possuía de extraordinário e só muito raramente renunciava a uma chave contida. Ainda assim, Escorel conseguia emocionar profundamente a platéia.

Marcelo Faria

Responsável pelo debochado, charmoso e amoral Vadinho de "Dona Flor e seus dois maridos", de Jorge Amado, Marcelo Faria exibiu a melhor performance de sua carreira, irrepreensível tanto nas passagens mais engraçadas quanto nas mais dramáticas, em especial naquela em que se despede de Dona Flor.

Stephane Brodt

Possuidor de técnica impecável, Brodt mergulhou profundamente na pele dos dois personagens que interpretou em "O dragão", deles extraindo tudo que era possível, conseguindo emocionar a platéia e levá-la a refletir sobre os graves temas do espetáculo.

Leonardo Franco

Na pele do marido traído, o ator exibiu, em "Traição", a melhor atuação de sua carreira, valorizando ao extremo as principais características de seu personagem, um homem cuja inteligência equivalia ao cinismo e pragmatismo com que lidava com a adversa situação de ter sido traído por seu melhor amigo.

____________________

ATRIZ

Isabella Parkinson

Única personagem feminina de "Traição", a atriz conseguiu materializar uma personalidade tanto angustiada e dividida como também amorosa e sedutora, contracenando no mesmo nível com Isio Ghelman e Leonardo Franco.

Liliana Castro

Exibiu uma atuação emocionante em "Por uma vida menos ordinária", tanto pela enorme capacidade de entrega quanto pela consciência que evidenciou de estar interpretando não tanto uma personagem particularizada, mas um símbolo de atitudes e comportamentos típicos de uma sociedade que cada vez mais se afunda na sordidez.

Carol Portes

A grande revelação da temporada. Na pele de Evelyn, a atriz exibiu carisma, forte presença cênica e notável capacidade de explorar todas as facetas de sua complexa personagem, sendo uma das grandes responsáveis pelo êxito de "A forma das coisas".

Ana Abbott

Na pele da atormentada e única personagem de "Sem Ana", a jovem atriz exibiu recursos expressivos nada desprezíveis, tanto vocais como corporais, além de comovente e corajosa capacidade de entrega, vivendo intensamente todos os sentimentos, dúvidas e contradições de uma personalidade complexa e momentaneamente desestruturada.

Inez Vianna

Possuidora de vastos recursos expressivos, a atriz foi uma presença absolutamente fascinante em "A mulher que escreveu a Bíblia", conseguindo cativar o espectador desde o primeiro momento com seu carisma, humor e notável capacidade de alternar ritmos.

___________________

CENOGRAFIA

Aurora Campos

Utilizando basicamente quatro pilastras brancas que, no decorrer de "A forma das coisas", iam formando múltiplos ambientes, transformando a cena à medida que os personagens se transformavam, Aurora Campos criou a cenografia mais interessante e surpreendente da temporada de 2008.

FIGURINOS

kika Lopes

Aproveitando ao máximo todas as possibilidades oferecidas pelos muitos personagens de "Clandestinos", Kika Lopes criou figurinos criativos e divertidos, sempre em total sintonia com as personalidades retratadas.

ILUMINAÇÃO

Paulo César Medeiros

Um dos grandes destaques de "Por uma vida um pouco menos ordinária" foi a soturna luz de Paulo César Medeiros, que contribuiu de forma decisiva para a criação da atmosfera de pesadelo que caracterizava o ótimo espetáculo dirigido por Gilberto Gawronski.

TRILHA SONORA

Carlos Bernardo

O profissional teve participação vital em "O dragão", tanto no que diz respeito à música como à sua execução, fundamentais para o êxito de uma das montagens mais sérias, belas e significativas da temporada de 2008.

Um comentário: